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O ar condicionado e o Covid-19

À medida que a pandemia se expande fica evidente que o mundo não voltará a ser o que era e tão importante quanto estarmos conscientes da nova realidade é entendermos as ações que não foram tomadas e contribuíram com a situação em que vivemos.

O HOJE

Não há dúvidas que um dos elos mais fortes na corrente do contagio entre a COVID-19 e as pessoas é o ar, é nele (no ar) que as tais gotículas contaminadas pairam por horas até encontrar uma nova mucosa ou orifício alheio a contaminar, em diversas ocasiões há um vetor intermediário neste ciclo, o sistema de ar condicionado. Este que tinha tudo para ser o mocinho de nossa história munido de suas normas e parâmetros de controle está hoje na sela do cavalo do bandido. Não é difícil encontramos recomendações de Órgãos de Saúde para evitarmos locais fechados ou com pouca renovação de ar, nitidamente opostos as instalações de escritórios e fabricas onde trabalhamos por muitas horas.

As instalações de ar condicionado ditas como tradicionais se mostraram ineficientes ao que parece ser um novo mundo, porem lhes garanto, de novo não há nada, epidemias, problemas respiratórios e alergias são velhos conhecidos, somos nós que nos habituamos a um parceiro que nem sempre joga no mesmo time, afinal ruim com ele e pior sem ele. Já se perguntaram como seria a vida sem a climatização como a conhecemos? Acreditem, não necessariamente mais quente e certamente com muito menos problemas respiratórios.

O ONTEM

Desde sua invenção em escala industrial, no início do século XX, a refrigeração enfrentou muitos obstáculos e alguns preconceitos, mas como sabemos encontrou seu lugar no mundo moderno pelas vias da comodidade. No início cogitaram que o frio artificial era nocivo, acusação sem provas que logo foi descartada, porem décadas mais tarde, no início dos anos oitenta, a mesma Organização Mundial de Saúde que hoje baliza as orientações da mais recente epidemia, descobriu que a morte de mais de trinta pessoas em um edifício americano foi causada pela bactéria egionella pneumophila oriunda da falta de manutenção no sistema de ar condicionado, obviamente medidas foram tomadas, normas atualizadas e procedimentos implementados na ocasião.

Seria calunia dizer que não houve uma tremenda evolução no que se entende por programação, manutenção e operação dos sistemas de ar condicionado, porem a luz da nova realidade que nos é apresentada fica claro que paramos no tempo, algo como uma cortina foi passada na realidade da disseminação de vírus pelo ar condicionado, a renovação e tratamento de ar tão necessários a eliminação de fatores de risco epidemiológicos não foram devidamente abordados, tomo como exemplo a declaração do Sr. Mario Sérgio Almeida, presidente do DNPC da Abrava, sobre a revisão de norma NBR 16401-03 de renovação e tratamento de ar

“Houve um grande avanço no cálculo da vazão de ar exterior tratado, a fim de promover a renovação de ar interior, com o propósito de manter a concentração de CO2 metabolizado no nível estabelecido pelo profissional de projetos. Doravante, será possível definir qual a concentração de dióxido de carbono desejada para o ambiente climatizado, e, desta forma, garantir que o resultado seja alcançado”, explica Almeida em entrevista de maio de 2018.

Ocorre que o parâmetro predominante na renovação, o dióxido de carbono (CO2), não é fator de risco viral e epidemiológico e está restrito “apenas” a complicações como sonolência, dores de cabeça e produtividade profissional. Não é difícil encontramos verdadeiros furos em outras partes da mesma norma.

Sobre o que se refere a filtragem do ar, conforme o IAQ Guide, publicado em 2009 pela ASHRAE, a baixa qualidade do ar interfere diretamente no desempenho dos trabalhadores em edifícios comerciais. A economia em custos com assistência à saúde, absenteísmo e perda de produtividade pode chegar a dezenas de bilhões de dólares anualmente nos EUA (EPA 1989; Fisk 2000; Mendell et al. 2002). Aparentemente a preocupação com a produção dos trabalhadores e os custos envolvidos excede a responsabilidade que a instalações tem com os fatores de riscos que estes ambientes apresentam.

Conforme a ISO Standard 16890-1:2016, o grau de filtragem dos filtros usados em ambientes comerciais, tem como parâmetro a retenção do particulado restrito a queima de combustíveis fósseis, queima de biomassa vegetal, emissões de amônia na agricultura e emissões decorrentes de obras e pavimentação de vias, mais uma vez fatores virais estão ausentes apesar de serem conhecidos equipamentos com potencial de redução e até erradicação de vírus e outras formas de patógenos no ar como o tratamento por luz ultravioleta (UV) e fotocatalíticos.

O site NaturalAr informa que relatos médicos indicam que os purificadores de ar são uma ferramenta para aliviar problemas ligados a crises alérgicas. Voluntários demonstraram que após 3 meses de uso desses equipamentos em casa e trabalho e comentam: “O purificador trouxe conforto ambiental e menos problemas ao trato respiratório, decresceu a quantidade de espirros” “dorme-se melhor, o nariz está menos congestionado e os olhos menos irritados” “odores de quartos e salas também desaparecem.” Apesar de eficiente, equipamentos do gênero não são uma necessidade normativa das instalações

O AMANHA?

Esperasse um amanhã parecido ao que ficou conhecido como “Gripe Espanhola”, ocorrido entre 1918/20, estamos restritos as medidas sanitárias de cem anos atrás. No âmbito da climatização, não se deu a devida atenção ao número de epidemias e surtos dos últimos 20 anos, neste período doenças como influenza e o H1N1 se mostraram presentes ceifando miliares de vidas em nível mundial.

Talvez essa nova maré de realidade traga à tona uma modalidade de condicionamento até então desconhecida do grande público, conhecida como climatização ecológica está vertente do condicionamento de ar tem por base princípios físicos de caráter natural, como a ventilação natural conforme aponta o arquiteto Henrique Hoffman em sua declaração em entrevista sobre o assunto “A ventilação natural ajuda a prevenir doenças respiratórias pelo fato do ar estar sempre renovado, o que é importante tanto para minimizar a propagação de vírus e bactérias, quanto para a qualidade interna do ar, já que, ao respirar, o organismo transforma oxigênio em gás carbônico. Tempos atrás, era muito comum famílias inteiras se mudarem para cidades com boa qualidade de ar para tratamento de doenças respiratórias”.

Outra ferramenta de climatização poderosa chamasse resfriamento evaporativo, a qual utiliza o princípio da evaporação da água em contato com o ar, para diminuição significativa da temperatura chegando em certas regiões do Brasil a ter o mesmo desempenho da climatização tradicional. O professor José Rui ressalta em seu livro Resfriamento Evaporativo que “” … (o resfriamento evaporativo) tem como atrativo o baixo consumo de energia, facilidades de manutenção, instalação e operação. Por não utilizar gases CFC ou HFC não agride o meio ambiente.” e completa que “por ser um sistema que opera com renovação total de ar, não existe recirculação e evita-se a proliferação de fungos e bactérias, problemas constantes nos sistemas de condicionamento de ar convencionais”.

Se voltar não é possível cabe então olhar para frente, a direção histórica segue o enrijecimento das regras, aprofundando do estudo do tema em destaque até que uma ameaça maior nos faça refletir novamente. Fica o desejo particular que métodos de climatização hoje taxados como alternativos ganhem uma nova alcunha, chamemos de “climatização humanizada”, já que ao que parece respirar ao ar livre ainda é um santo remédio.

Fernando Adam (professor da YCON)